quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

A ARTE DA CONVIVÊNCIA

Marcus Labatti, Gustavo Werneck e Alexandre Toledo, elenco de ARTE
Como já disse e repeti exaustivamente nesse blog, não sou crítico de nada. De cinema, literatura, teatro... absolutamente nada. Não me sinto qualificado pra nada disso e nem tenho uma formação adequada pra exercer este papel.

Mas, sou um consumidor - menos do que já fui e menos do que gostaria - mas, ainda assim, um consumidor atento, com o bônus de já ter estado, e muito, do outro lado do balcão. Produzi bastante na área cultural, sobretudo teatro. Até me orgulho de ter participação em alguns sucessos, seja como produtor, diretor ou autor.

Introdução como sempre grande e repetida pra só então entrar no assunto: O espetáculo ARTE, em cartaz no Teatro da Cidade, em Beaga, agora na programação da Campanha de Popularização do Teatro e da Dança. Queria ter escrito aqui no blog assim que assisti (na estreia), mas a nossa velha conhecida procrastinação empurrou até hoje. Escrever no calor da emoção é bem mais legal, ainda mais pra quem só pode mesmo se basear e se motivar na emoção, pelos motivos já citados acima.

Enfim, ARTE tem como mote uma discussão meio clichê em artes plásticas. Afinal, o que é arte? O que qualifica uma obra valer milhões e outras tantas serem comercializadas apenas cobrindo o preço da tela e da tinta? Se meu filho de cinco anos pode fazer  igual, porque esse desenho do Picasso custa tão caro?

Pessoalmente, acho que no espetáculo essa discussão é apenas o estopim pra algo muito mais cotidiano e que, por ser tão cotidiano, encontra total identificação com a plateia. A ARTE tratada em cena é outra. No palco, três atores nos falam da arte dos relacionamentos, das amizades, e das pinceladas de verniz que cobrem toda convivência.

Sem dar spoiler, pois isso faz parte da divulgação e pode ser lido em qualquer release, a história começa com a compra de um quadro por um dos personagens, que paga por ele um valor altíssimo. Pequeno detalhe: Este quadro é totalmente branco. Movido pelo perigosíssimo “sincerídio”, o primeiro amigo para quem ele orgulhosamente apresenta a obra resolve dar a sua opinião verdadeira. E essa verdade vem adornada por extrema agressividade. O segundo amigo torna-se o fiel da balança. Vamos lá, vamos ver o que ele acha. E aí, sabe aquela pessoa vaselina? Pois é, forma-se então o cabo de guerra num triângulo nada amoroso.

Eu sei que não existe esse gênero, mas pra mim ARTE poderia ser definida como uma “comédia chic”. Comédia porque a gente ri da primeira à última cena, um riso de identificação, de se perceber nas situações apresentadas, e “chic” porque o humor vem embalado numa certa “erudição”. No desenvolvimento da peça, os ânimos vão se exaltando de maneira tal que o verniz social acaba não resistindo a tantas trincas e o pau quebra com força. Embora em nenhum momento o texto identifique de onde surgiu a tripla amizade (que já dura 20 anos) muita roupa suja precisa ser lavada e a discordância sobre o quadro abre a torneira.

Esse humor, com a dose referida de complexidade, é bem realizado e catártico graças ao trabalho harmônico dos três atores que compõe o elenco. Gustavo Werneck, Alexandre Toledo e Marcus Labatti se revezam no protagonismo, cada um com seus momentos de condução da ação. Aí também dá pra sentir a mão experiente do diretor Sérgio Abritta, cujo maior mérito no espetáculo talvez seja ter conseguido nivelar as interpretações com a régua bem no alto, não deixando que se criasse nenhuma brecha ou escorregão, as famosas “barrigas” tão comuns no andamento cênico.

Pra entender melhor todo o jogo, só indo ver de perto. Recomendo demais e alerto que você não precisa ter medo de uma enfadonha discussão "teórica socioantropológica". Nada disso. Você vai é se deparar com a sua própria vida e os encantos e desencantos da convivência entre amigos. Seus amigos.

Onde? Teatro da Cidade, de quinta a domingo, do dia 30/01 a 16/02. Quinta a sábado ás 20:30 e domingo às 19h.

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